7 de outubro de 2017

História ilustrada - Devoção Congadeira e a história de Nossa Senhora do Rosário entre as Irmandades do Rosário no Brasil


Artista convidado: Alexandre Rosalino



Hoje, 7 de outubro, é dia de Nossa Senhora do Rosário. Considerada a Padroeira dos negros, Ela é festejada por Nações de maracatu e Irmandades congadeiras espalhadas por diversos cantos do Brasil... Por isso, hoje eu peço licença para (re)contar aqui uma história que ouvi muitas vezes, de variadas fontes, em diferentes contextos e com nuances diversas, contada por homens e mulheres d'Ela devotos.

Evitando fugir muito ao tema principal desse blog (que é artesanato), eu convidei, para ilustrar essa história, um artista que traz consigo forte vivência entre aqueles devotos de Nossa Senhora do Rosário (ele próprio, aliás, um devoto), fato que marca a temática de parte de seus quadros, inspirados nas festas, na musicalidade e na fé de homens e mulheres herdeiros e mantenedores dessa tradição que ele conhece tão bem. Ao ser convidado a participar deste post, Alexandre Rosalino, muito gentil e generosamente, agarrou a "missão" de criar um quadro especialmente para esta ocasião! ♥ ♥ ♥ Eita, que assim eu fico besta! Quanta honra♥ /\ ♥ 

Pois bem... vamos à história - que não é minha, mas daqueles homens e mulheres que a celebram todos os anos... Ela não tem local preciso nem data exata - como bem devem ser, aliás, as histórias que servem ao  arcabouço do Coletivo, onde podemos caber todos nós...

Dizem que o fato se passou muitos e muitos anos atrás... 


Num certo dia, daqueles tempos ainda de escravidão, num lugar onde hoje não seria possível precisar, o que se sabe de certo mesmo é que Nossa Senhora do Rosário apareceu no mar! E que, rapidamente, o dono daquelas terras mandou seus homens de confiança resgatarem a Santa. Aos negros, seus escravos, ordenou a feitura de uma capela para abrigá-la. Capela erguida, a Santa resgatada foi então posta no altar e daí foi um tal de oração prum lado, ladainha pro outro, bênção de padre amigo da nobre família e tudo o mais de pompa que a ocasião merecia!

(Naqueles tempos, a gente sabe, os negros não podiam entrar nas igrejas - mesmo tendo sido erguidas por eles - e, portanto, ficaram de fora de toda a celebração...)

Ocorre que, misteriosamente, mesmo com capela erguida, rezas e bênçãos oferecidas, no dia seguinte a Santa tornou a aparecer no mar. E lá se foram outra vez os homens de confiança do sinhô buscá-la para colocá-la de volta em seu lugar, na capela. Mas o fato misterioso tornava a suceder nos dias seguintes... Quantas vezes fosse retirada do mar e colocada no altar da capela, tantas vezes a Santa tornava a aparecer no mar...

Após inúmeras tentativas frustradas, foi a vez de os negros, eles próprios, tentarem resgatar a Santa de uma vez por todas. Mas eles não entraram no mar para pegá-la. Não. Eles ficaram foi na beira da praia, de onde era possível avistá-la entre as vagas. Ali mesmo se dividiram em 2 ou 3 grupos com seus tambores feitos de pau ocado e folhas de bananeira (ou de couro de bicho...) e, ali mesmo, se puseram a cantar, a dançar e a tocar em reverência à Nossa Senhora do Rosário, que estava no mar (de onde, aliás, também aqueles homens e mulheres - ou seus antepassados - vieram chegar em terras de cá).

Um grupo, formado pelos mais jovens, "puxava" cantigas de grande vigor e tinha movimentação ligeira. Outro grupo, formado pelos mais velhos, vinha atrás, mais devagar, e entoava cânticos mais solenes, de notas longas e ritmo mais lento... Cada grupo cantava ao seu modo, com ritmos diferentes e todos ao mesmo tempo!

Ao passo que cantavam e tocavam, a Santa vinha se aproximando da praia, mais e mais, como que trazida pelas ondas ou... como que embalada magicamente pela cadência daquelas músicas e pela força daqueles homens e mulheres que cantavam para Ela!

Quando estava já bem perto da praia, Nossa Senhora pôde ver nos olhos daqueles homens e mulheres (mais que as feridas e as marcas que traziam em seus corpos) a dor que carregavam na alma, fruto da escravidão. E dizem que foi então que Ela se sentou sobre um dos tambores que os negros tocavam (aquele, sim, o SEU LUGAR - entre aqueles que cantavam em Sua devoção!) e que ali, diante deles e entre eles, foi que, compadecida de tanto sofrimento, Ela chorou...

Dizem que no lugar onde Ela chorou, bem onde o seu pranto tocou o chão, nasceu um pé de Lágrima de Nossa Senhora, de onde os herdeiros dessa tradição extraem as contas que usam, até os dias de hoje, para fazer o seu Rosário, que lhes fora dado por Ela.

O tambor onde Ela se sentou, chamado candombe (aliás, um naipe inteiro de tambores), é hoje guardado como relíquia em diversas Irmandades, não saindo nas ruas em cortejo, por se tratar de tambor sagrado. Em seu lugar saem às ruas as caixas, os patangomes, as gungas..., mas o candombe é usado até os dias de hoje para firmar bandeiras, quando se erguem os mastros nas festas que ocorrem em diversas comunidades congadeiras do nosso país.

Os cortejos saem ainda em dois grupos, hoje comumente chamados de ternos ou guardas. Como na antiga história, as duas guardas saem juntas. A mais jovem e de cantigas mais alegres e ligeiras, ficou conhecida como guarda (ou terno) de congo. Já a de toadas mais lentas e solenes, e formada pelos mais velhos, guarda (ou terno) de moçambique. Em algumas regiões, sabidamente no norte de Minas Gerais, esses grupos estão representados como Catopês e a eles se juntam outros grupos ainda... Marujadas, Caboclinhos e Caixas de Assobio cantam, tocam, dançam e saem em cortejo para louvar Nossa Senhora do Rosário!

Em seus ritos de devoção, esses grupos passaram a contemplar também São BeneditoSanta Efigênia (dentre tantos outros santos católicos) e relembram em suas cantigas as dores dos seus antepassados (que viveram os horrores da escravidão) e temas como a libertação dos escravos, por vezes cantando ainda para Oxalá, para Iemanjá, para Xangô etc, mesclando e amalgamando culturas de matrizes diversas num calendário festivo que (dependendo da Irmandade) tem início entre agosto e outubro e se estende até maio do ano seguinte.

Nas diversas regiões onde é festejado o Reinado de Nossa Senhora (também popularmente conhecido como "congado" ou "congada"), cada Irmandade, cada capitão e capitã, cada bandeireira e caixeiro, cada criança, devoto e irmão, todos contam aquela mesma história de Nossa Senhora resgatada do mar - obviamente dando nomes e características próprios da sua região, da sua cultura, do seu histórico social e focando neste ou naquele detalhe, de acordo com as histórias que ouviram de seus antepassados e que vêm sendo recontadas e retransmitidas de geração a geração...

No fundo, guardadas as particularidades inerentes a cada Irmandade (que revelam variáveis sociais, regionais etc...) a história é sempre a mesma e une a todos enquanto Filhos do Rosário e descendentes de uma mesma tradição.

Viva Nossa Senhora do Rosário!

Viva todo o Povo do Rosário! 

Vivam as Irmandades Congadeiras de todo o Brasil!

E vivam as histórias, os costumes e a fé, quando são capazes de nos unir de novo como IRMÃOS que verdadeiramente somos!

Coisicas Artesanais - Alexandre Rosalino
Sem título - óleo sobre tela - Alexandre Rosalino

"Lá no alto mar, êêê... tem uma luz que brilha
Lá no alto mar, êêê... tem uma luz que brilha
É o reflexo sagrado 
que alumeia o Rosário 
de Maria
É o reflexo sagrado 
que alumeia o Rosário 
de Maria"
(canto tradicional das guardas de moçambique em Minas Gerais)

* * *

Quero agradecer enormemente e do fundo do meu coração ao artista plástico Alexandre Rosalino, que se prontificou a pintar tão belo quadro (e carregado de memórias, de cores, fantasia, sentimento...) especialmente para este post! Quando o contactei, há alguns meses, com uma proposta maluca (sim, porque eu fiz a "encomenda" avisando que não iria comprá-la (!), que era tão somente para publicar aqui no Coisicas), ele, generosíssimo, em vez de me achar uma louca-varrida ou me mandar catar coquinho na ladeira, se envolveu, se entregou e decidiu participar!

Rosalino, querido, eu nem encontro palavras para demonstrar o tamanho da minha gratidão... Me sinto muito feliz e honradíssima com tua participação tão especial! Muito agradecida pela confiança e pela generosidade. Gradicidimáis da conta-! ♥ ♥ ♥

Quero agradecer também, e acima de tudo, à cada irmão e irmã da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis, pela acolhida generosa e carinhosa de sempre e entre os quais eu pude ver e sentir essa história pelo lado de dentro e vivenciar um pouco dos seus desdobramentos e seus mistérios, o que mudou a pessoa que eu sou e pelo quê me sinto profunda e eternamente agradecida! /\

Aos leitores, aviso que pretendo apresentar Alexandre Rosalino "formalmente" aqui no Coisicas... Contar como o encontrei, falar um pouco da sua obra, do seu envolvimento com o congado mineiro, enfim... trazê-lo pruma boa prosa/entrevista para vocês poderem conhecer um cadiquinho mais esse artista tão especial!

Por ora, deixo vocês curiosos e na expectativa, apenas com o gostinho bom dessa "provinha" belíssima e generosa com que ele nos presenteou...

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4 de outubro de 2017

Coisicas Artesanais - Mini badulaque inspirado em sonho bom


Recentemente eu tive um sonho bom, daqueles que deixam gostinho de coisa realmente vivida e flashes de imagens que parecem muito reais ao longo do dia... Eu estava numa casa antiga, muito bonita, de uma beleza muito simples... As paredes caiadas em tons pastel, uma rosa, uma outra azul... Era uma casa grande e arejada, com poucos móveis, e toda ladeada por varanda que dava prum quintal de árvores de pequeno porte. 

De dentro daquela casa (que não era minha e nem de ninguém que eu conhecesse), eu ouvia que me chamavam do lado de fora e então eu fui lá ver o que era. Um embrulho do tamanho dum livro acabava de chegar para mim, trazido por um homem que supus ser o carteiro da região... 

Sonhos são mesmo assim. Embora eu não conhecesse aquela casa e nem soubesse por qual razão eu me encontrava ali, não estranhei nem um pouco o fato de chegar uma encomenda para mim naquele endereço que não era meu. Abri o pacote que acabara de receber e me deparei com um lindo colar que, pela naturalidade da minha reação, mais parecia ter sido encomendado por mim mesma. O colar tinha um enorme pingente de madeira, em formato de coração, com um pombinho aplicado sobre ele, e seu cordão era grossinho, com muitas, muitas continhas em tons de branco, bege e dourado. 

Ao experimentá-lo em mim, percebi que o cordão era muito curto e não chegava a circundar nem metade do meu pescoço e que o pingente de coração era demasiado grande para o meu colo (devia ter uns 15 cm). Fiquei triste com a constatação: um colar tão lindo não me serviria, não cabia em mim, eu não poderia usá-lo... Mas a decepção durou uma fração de segundo e, na fração seguinte, eu tive o impulso quase involuntário de pendurá-lo na parede.

Pendurei o colar na parede azul clara, pelo ganchinho do pingente, e deixei que as duas pontas do cordão caíssem por sobre o coração com suas muitas contas de cores claras.

Ao vê-lo assim, na parede, com o coração e o pombinho meio encobertos por tantas contas, entendi (ali no sonho) que não se tratava, de fato, de um cordão, mas de um "pingente-proteção", uma espécie de amuleto ou medalhão, um "bentinho" para o lar... E, então, fiquei feliz demais da conta!

Acordei com a sensação benfazeja daquele sonho bom me inundando o peito. Feito marola branda que vem dar de mansinho na areia da praia, a imagem daquele penduricalho fofo na parede daquela casa, sobejando proteção, me visitou ao longo daquele dia e nos dias seguintes... Desejei ansiosamente reproduzi-lo!

Não posso enganar vocês: o do sonho era infinitamente mais belo! (E creio que impossivelmente reproduzível...). Mas este aqui está "no jeito" e chega radiando sentimento bom, amparo e amor! ♥

Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
No meu lar, no meu rincão, sempre Luz e Proteção!

Descrição: pombinho de madeira aplicado sobre coração de madeira, patinados e encerados, com aplicação de cordas, pingentes, perolinhas, rococó e fita.

Atualizado: "tem mas acabô"!

Mas não fica triste, não... Visita a Lojinha e escolhe outra coisica procê! ;)

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1 de setembro de 2017

Entrevista - Artesanato e os caminhos da superação - Um 'papo cabeça' com a terapeuta Edna Pinto Chagas


Muito se ouve dizer sobre o efeito curativo do artesanato para aliviar o coração, desanuviar a mente, combater o stress e a ansiedade, resgatar a confiança, a autoestima etc. Mesmo em casos clínicos, a dedicação (ainda que temporária) a trabalhos que envolvam criatividade e fazer manual parece trazer resultados positivos consideráveis na recuperação dos pacientes.

Aqui mesmo, no Coisicas Artesanais, já tivemos o relato da Gílian, que atribui ao seu envolvimento com o artesanato o fato de ter conseguido vencer uma forte depressão, e conhecemos o trabalho do Renato, que passou a se dedicar à criação de pequenas mandalas de barro, sua "defesa" contra as dores provocadas por uma doença com a qual é obrigado a conviver.

E foi pensando nesse forte elo entre artesanato e cura, ente fazeres manuais e bem-estar, que decidi convidar Edna Pinto Chagas para uma entrevista aqui no Coisicas. Terapeuta junguiana, Edna lança mão de técnicas criativas, histórias, artesanato, atividades lúdicas etc para conduzir seus pacientes por caminhos de autoconhecimento, cura e superação. Eu própria fui por ela conduzida... por 11 anos!

[Apegada, eu?? Esperem até conhecê-la um pouquinho nessa entrevista e vocês compreenderão...]

E, por tudo isso, convido também vocês a participarem dessa entrevista que poderá ter certo ar de "papo cabeça". Mas não só... Será também um "papo alma", um "papo coração"... Porque, é certo, esta será uma conversa que, envolvendo nossas questões tão humanas, não poderia deixar de lançar luz sobre o TODO que somos. 

Coisicas Artesanais - Edna, tem "mágica"??
Edna Pinto Chagas - A mágica que tanto nos deslumbra é, em verdade, uma ilusão dos sentidos. Costumamos chamar de mágica aquilo que nos fascina. Neste sentido, tem mágica sim, tem envolvimento e deslumbramento.

C.A. - Hummm... e como se passa essa "mágica" dentro da gente? O que acontece quando a gente começa a fazer um trabalho manual e fica envolvido de uma tal maneira que, de repente, percebe que perdeu até noção da hora?... 
E.P.C. - Mudamos o nosso funcionamento habitual, que privilegia o hemisfério cerebral esquerdo (racional, lógico, cético, matemático, concreto) e colocamos em funcionamento o hemisfério cerebral direito (criativo, intuitivo, sonhador, abstrato). Quando a razão consegue ficar um pouco de lado, abrem-se novas perspectivas. O ideal, como propõe Jung, é harmonizar os opostos: não isso OU aquilo, mas isso E aquilo...

C.A. Sim, claro... Apenas quando conjugamos os nossos "múltiplos" é que podemos ser INTEIROS, né?... Mas, então... quando a gente está fazendo um trabalho manual, a gente está ativando e integrando nosso "lado  emoção" e nosso "lado razão", digamos assim, e colocando os dois para "trabalhar juntos" e, então, nesse momento, estamos "inteiros" e, portanto, mais "capacitados" a lançar novos olhares e acessar novas "respostas" para as coisas que nos cercam... É isso?
E.P.C. - É isso mesmo, e é muito bom!... 

C.A. - Edna, você, primeiramente, se formou e trabalhou nas áreas de letras e informática, certo? Em que momento da sua vida você despertou o olhar para a terapia? O que te moveu a buscar compreender e ajudar as pessoas por esse viés? 
E.P.C. - Depois de ter experimentado os dois lados, o humano e o tecnológico por muitos anos, eu ainda pensava que tinha que me submeter ao “isso OU aquilo”, mas havia uma certa insatisfação dentro de mim... eu me achava esquisita, não muito bem definida. Um dia me dei conta que, em toda a minha vida, as pessoas me procuravam para compartilhar seus sentimentos mais profundos. Como professora, isso acontecia com meus alunos. Até mesmo amiguinhos da minha filha me contavam coisas que eles diziam que não queriam abrir para seus pais. Na Informática, em empresas grandes, os colegas sempre colocavam uma cadeira na frente da minha mesa e sentavam ali para um papo “secreto”. Só muito depois eu me dei conta que ali estava uma semente que acabou me levando à Psicologia.

C.A. - Outras especialidades e modos de terapia chegaram antes da Psicologia pra você, certo? Como foi esse processo? O que você buscava?
E.P.C. - Não foi simples; eu resistia muito em voltar aos bancos universitários pela terceira vez, especialmente porque já tinha 50 anos. Comecei a fazer umas formações mais curtas, de um ou dois anos: Dinâmica de grupo, Terapias naturais, Cromoterapia, Massagens Bioenergéticas, Psicodrama pedagógico e organizacional, Arteterapia... Um dia, atendendo com arteterapia, recebi uma moça que havia saído de internação em uma instituição psiquiátrica e pude ver, além das marcas físicas que ela trazia por ter sido fortemente amarrada, o seu profundo sofrimento. Isso foi o empurrão final para que eu percebesse concretamente que precisava estudar mais sobre o ser humano e fui fazer Psicologia. Acho que o fio condutor que costura minhas diferentes experiências de vida é o respeito e o amor pelas pessoas e um desejo profundo de ajudá-las a encontrar as respostas que estão dentro delas mesmas.

C.A. - Sim, pois é... Parece até irônico porque, de certo modo, todos nós já temos as "respostas" que tanto buscamos, né? O "problema" é que para acessar essas respostas também precisamos descer ao nosso "porão", escuro e cheio de "tralhas"... E penso que, mais que coragem, é preciso muita disposição para encarar nosso "porão", né? (E fazer a "faxina"! rs)... E, também por isso, é tão importante encontrarmos um profissional que nos ajude nesse processo e nos conduza com amor...
E.P.C. - No “porão” existe a tralha, mas existe também nosso potencial ainda não explorado... e esse é o tesouro que vale a pena explorar... 

C.A. - Sim! Como eu ia dizendo... um profissional que nos conduza com amor e nos ajude a lembrar/perceber que no porão não tem só tralha! Rsrs... E, vem cá... Desde  menina, você sempre demonstrou inclinação para trabalhos manuais e artesanato ou isso surgiu a partir do seu encontro com a arteterapia?
E.P.C. - Eu sou de uma geração que aprendia na família e na escola os trabalhos manuais. Ainda menina, minha avó e minha bisavó me ensinaram a fazer tricô e crochê. Minha mãe me ensinou a trabalhar com papel e também a pintar. Ela sempre me levou para visitar museus e exposições. Assim, trabalhar com as mãos em criações expressivas fez parte da minha vida desde cedo. Chegar à formação em Arteterapia foi consequência...

C.A. - Bacana. E é mesmo: a garotada de gerações anteriores era mais habituada aos fazeres manuais...
E.P.C. - E era muito rico ter a possibilidade desse acesso... 

C.A. - É verdade... Bem, nos últimos anos você descobriu e desenvolveu um trabalho super bonito com Mandalas, onde "brinca" com cores e formas e, assim, elabora a tua própria expressão artística... Como é, para a terapeuta que conduz diversos pacientes por técnicas artesanais, trabalhos criativos e fazeres manuais, se ver também conduzida pela arte?
E.P.C. - As mandalas possuem algumas características que me agradam... Primeiro, sua simetria, que atende a meu lado racional. Segundo, a variedade e combinação das cores e formas, que atende a meu lado criativo. Fiz muitas experiências com diferentes suportes e técnicas até chegar ao que eu hoje chamo de Mandalas Pessoais, seja na sua expressão de Monogramas, seja na sua expressão de Vibração, escondendo palavras que emprestam sua vibração a um ambiente. Estou escrevendo um livro sobre essa trajetória, mas também exponho isso no meu blog. Criar essas mandalas é, sobretudo, uma experiência de muito prazer e me ajuda a mergulhar dentro de mim, desvelando muitas questões...

Coisicas Artesanais - Edna Pinto Chagas
Esta aqui me foi dada de presente♥. Você consegue ver qual palavra ela guarda?

C.A. - Hummm... Então esse processo criativo das Mandalas exerce em você a mesma "mágica" e... também a terapeuta "entra em terapia"?
E.P.C. - Claro... O terapeuta precisa estar também em terapia para não misturar suas questões com as das pessoas que o procuram. Gosto da expressão que Roberto Crema usa para designar o par terapeuta/paciente: companheiros evolutivos... Gosto porque destaca o ponto de que ambos estão em crescimento e não um deles mais passivo...

C.A. - Sim... E, afinal, o terapeuta, para além de ser terapeuta, segue sendo humano, né? (Aliás, ainda bem! Rsrs)... E, vem cá... Que bacana isso do teu livro, hein! Quando rolar o lançamento, vem contar pra gente aqui! =)
E.P.C. - Com certeza... Mas é um projeto que só deve ficar pronto no ano que vem... 

C.A. - Opa! Já estou na expectativa! ;) Edna, nas nossas sessões de arteterapia eu aprendi muitas técnicas incríveis com você... A que mais me deixou "tarada" à época (rsrs) foi aprender a fazer mosaicos de ladrilho... Lembro que comprei material para poder fazer também em casa e que, nessas ocasiões, eu era capaz de ficar horas seguidas debruçada sobre a mesa e nem fome eu sentia! Creio que foi a técnica que mais mexeu comigo... Há alguma técnica com a qual você se identifique mais e que te dê mais prazer ensiná-la e concretizá-la com seus pacientes?
E.P.C. - A técnica do mosaico permite simbolicamente desconstruir significados (quando você quebra os azulejos) e reconstruí-los (quando você reagrupa os cacos criando uma nova forma). Também gosto muito dela. Em uma outra alternativa eu uso papéis coloridos, ou recortando ou rasgando. Gosto também da variação que usa palavras ou imagens recortadas de revistas...

C.A. - Pois é! Esse negócio de, ainda que simbolicamente, quebrar o já pronto para reconstruir algo novo (e meu!) foi mesmo uma experiência "porreta"! Rsrs... Penso que podemos supor, então, que cada trabalho manual sugerido em terapia, cada técnica artesanal traz consigo uma "simbologia" que conduzirá nosso acesso ao "porão" e acenderá uma luzinha lá, para que possamos enxergar o que antes não víamos, certo?
E.P.C. - Certíssimo! O processo terapêutico se dá resgatando do inconsciente novas informações sobre você mesma. E assim ampliando seu nível de consciência... É o que está escrito no Oráculo de Delphos na Grécia... (conhece-te a ti mesmo) ou como está no evangelho: conhece a verdade e ela te libertará... Simples... mas nem tanto...

C.A. - Sim, simples "só que não", rsrs... Sabe, Edna? Uma amiga me contou que uma vez ela chegou no teu consultório se sentindo imensamente triste e chorando muito, e que vc a levou até a janela da tua sala e a entregou um frasquinho de bolinhas de sabão pra ela soprar e que esse gesto simples (soprar bolinhas de sabão na janela) foi capaz de tirar um peso insuportável do seu coração. Tem mais que meramente terapia aí, não? Tem delicadeza e sensibilidade também...
E.P.C. - Realmente, ela era uma pessoa muito reservada e introspectiva, e chegou nesse dia muito magoada e entristecida com algo que havia acontecido com ela. O silêncio dela era uma barreira entre nós. Estava claro para mim que ela precisava esvaziar o coração mas que não ia ser falando... Por isso, propus um exercício respiratório, usando as bolhas de sabão. Pedi que ela pensasse no que a estava oprimindo e soprasse com força para longe dela... Ficamos um bom tempo soprando bolhas de sabão pela janela, ela e eu, e observando sua trajetória, tamanho e os reflexos do sol nelas. Nunca fiquei sabendo o que a havia machucado tanto mas, ao sair do consultório, ela me abraçou e disse baixinho ao meu ouvido: "Obrigada... estou me sentindo bem mais aliviada". No meu modo de ver, não existe terapia se não houver delicadeza e sensibilidade...

C.A. - É... é emocionante esse teu relato... E como é que vc percebe o que propor pra cada paciente? É um olhar clínico? Ou é olhar com o coração??
E.P.C. - Mais uma oportunidade de exercitar o "E" ao invés do "OU"... Claro que o olhar clínico é imprescindível, mas sem o coração fica tudo muito frio. No caminho da terapia não há certezas, cada pessoa é única e, por isso, não há receita pronta... e é aí que entra o coração... Como recomenda Jung: conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana seja apenas uma outra alma humana...

Edna, querida, muitíssimo grata por essa entrevista concedida aqui pro Coisicas Artesanais. Aliás, muito grata por tudo! Gratidão é o sentimento mais intenso que aflora de mim por você, para além de algumas afinidades descobertas, para além do afeto construído e do carinho confirmado, para além do respeito e da admiração que ultrapassam o período em que fomos "companheiras evolutivas" ;) 

Muito grata! Pelo companheirismo, pela generosidade, pela doação...

É lindo e emocionante ver que você realiza o teu trabalho com tanto amor e que distribui esse amor entre as pessoas que procuram a tua ajuda para descer até seus porões, fazer a faxina e... encontrar insuspeitados tesouros!

Agradecida demais da conta! ♥

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E se você curtiu essa entrevista e quer conhecer um pouco mais a Edna e seu trabalho, ler reflexões que tornam o dia mais leve (ou que deixam uma pulguinha atrás da orelha, rs...) e, ainda, se está curioso para ver (e se encantar com) as lindas Mandalas por ela criadas, visite o seu blog!

Aqui: Edna Encontrarte
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30 de agosto de 2017

Carta aberta sobre a importância de dar os créditos, sobre corrupção e sobre o que uma coisa tem a ver com a outra (e você com isso)

Breve reflexão sobre a 'nossa parte nisso tudo'...


Alguns anos atrás, uma grande amiga, mãe de um menino com então 7 ou 8 anos, conversou comigo, estupefata, sobre o que tinha visto na feirinha de ciências na escola do seu filho. Na feirinha, vários estandes foram montados de acordo com os temas propostos para pesquisa e os trabalhinhos das crianças eram expostos em murais para que todos pudessem ler.

Essa amiga comentou que nenhum dos trabalhos citava a fonte (vá lá, trabalhinhos de crianças nessa idade não precisam necessariamente ter bibliografia, elas ainda terão tempo para aprender isso... Mas por que já não ensiná-las numa oportunidade como essa?). 

O que causou espanto em minha amiga, no entanto, não foi isso. Dentre aqueles trabalhos, havia um que era simplesmente um "print de tela" de uma página da internet, sem o cuidado sequer de uma edição do conteúdo. Não sei se uma criança de 7 ou 8 anos àquela época teria expediente para fazer uma busca no google, entrar num site dentre os encontrados com aquele tema e mandar imprimir o que achou a respeito... Suspeitamos que ela sequer tenha participado efetivamente daquela "pesquisa". E tampouco o seu "responsável"... Assim fosse, o "trabalho" impresso não traria também links e propagandas do site de onde fora extraído, demonstrando desleixo e escancarando a 'pirataria'.

Ficamos nos perguntando, minha amiga e eu, como é que aquele pai ou mãe não sentia vergonha de representar um 'papelão' daqueles... E ela, que é mãe, se perguntava ainda isso: o que aqueles pais estavam ensinando para aquela criança?

Nos últimos anos o nosso país tem sido assolado por notícias de corrupção e todos reagimos com justificada indignação, mas poucos realizam que a corrupção existe e se manifesta o tempo todo em pequenas coisas no nosso cotidiano... e que somos coniventes, quando não, agentes.

Poucos enxergam a corrupção, por exemplo, num "trabalhinho" impresso a partir de uma página da internet e apresentado na escola como se fosse do aluno; ou quando um de nós, por extremo cansaço ao fim de um dia de trabalho, na volta para casa, parece não notar que outras pessoas aguardam na porta do metrô para que saiam alguns passageiros da condução e, então, impaciente, entra esbarrando naqueles que estão por sair e "trapaceando" uma fila onde outros (possivelmente tão cansados quanto ele) aguardam educadamente a sua vez de entrar; ou ainda quando, naquele ansiado feriadão, no trânsito parado na estrada a caminho da praia ou da montanha, encontramos justificativa para "tirar o atraso" seguindo pelo acostamento...  

(Tratando-se de justificativas, aliás, se observarmos os "grandes corruptos" que têm sido pegos de "calça arriada" ultimamente, excetuando-se aqueles providos de boa dose de cinismo para negar o inegável até o fim, todos os demais terão alguma justificativa para o ilícito cometido...).

A corrupção existe onde as pessoas acham certo fazer o que sabem ser errado. E isso nos toca a todos em algum momento da vida... Os "grandes corruptos" que temos visto na TV e aqueles "pequenos" com quem convivemos (ou encarnamos, nós mesmos) no dia a dia, no cruzamento trancado no trânsito, na fila do transporte público para casa, na ultrapassagem pela direita... guardam em comum mais coisas do que podemos (ou temos a coragem de) suspeitar... Porque tudo esbarra numa questão de valores. E não me refiro aqui a montantes em dinheiro dentro de malas passadas de assessor a assessor... Me refiro a caráter, justiça, hombridade e senso de bem-comum que devem ser aplicados a todos (e não só a mim e não só quando convém). E, se pensarmos bem sobre esses valores, vamos concluir que sua base reside numa certa humanidade, que temos visto escassear sob as mais absurdas justificativas...

(Neste e em outros âmbitos, aliás, as "justificativas" têm servido apenas para que continuemos cometendo os mesmos erros de sempre livres do desconforto da vergonha que seria justo sentirmos...).

Por isso, retomando o mote que nos primeiros parágrafos serviu para introduzir esta reflexão, eu venho apelar para uma coisa muito simples, pequena e desimportante: se você gostou do que leu por aqui sobre algum artista, se quer copiar uma foto porque se identificou com ela, se vai apresentar um trabalho na escola (ou se você é o pai que vai ajudar o filho nisso) sobre barroco ou arte naif ou outros temas que eu acabo desenvolvendo neste espaço, se vai se valer de informações que encontrou aqui, seja honesto: cite a fonte e dê os créditos

Resgatemos o bem, o zelo, o respeito, a cordialidade que todos queremos e que nos têm feito já tanta falta; retomemos os nossos valores; sejamos melhores do que temos sido; sejamos mais humanos, mais justos e verdadeiros. É mais fácil do que a maioria pensa. Basta querer.

"Seja a mudança que quer ver no mundo". A frase, atribuída a Mahatma Gandhi, é inspiradora... Sejamos essa mudança, então! E comecemos pelas pequenas coisas, pelas "menos importantes", que são as mais tangíveis, porque é delas que estamos cercados e é com elas que construimos a nossa vida, o dia a dia, nosso cotidiano... E porque nas menores coisas e nas pequenas atitudes, afinal, já estamos escolhendo e definindo o que queremos, o que valorizamos e quem somos. Comecemos por elas. E comecemos desde já!

Grata,
Simone dos Santos.


Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
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8 de agosto de 2017

Lojinha: vendem-se Coisicas!



Para adquirir peças da Lojinha, entre em contato pelo e.mail:
coisicas.artesanais@gmail.com


 
Guirlandinha - R$ 40,00
(aprox. 12,5 cm de diâmetro)


 

 

Guirlandinha - R$ 40,00
(aprox. 13,5 cm de diâmetro)
Guirlandinha - R$ 50,00 
(aprox. 16,5 cm de diâmetro)


Guirlandinha - R$ 50,00 
(aprox. 15,5 cm de diâmetro)


Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Divininho - 30,00
(clique na foto para mais detalhes)




Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Bandeirinha - R$ 60,00
(da série Festas do Divino - Alcântara)
(clique na foto para mais informações)



Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Quadro rústico em madeira - R$ 60,00

 

 

Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Pombinho em flor de madeira - R$ 25,00
(clique na foto para mais detalhes)

 

 

 


Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Quadrinho flores de madeira - R$ 30,00
(clique na foto para mais detalhes)

Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Uai, Minas Gerais! - R$ 25,00
(clique na foto para mais detalhes)
Coisicas Artesanais - Simone Dos Santos
Divininho em coração de MDF forrado
com tecido e pingente tassel - R$ 30,00

(clique na foto para mais informações)





Divininho sobre toco de madeira - R$ 40,00
(clique na foto para mais informações)



Coisicas Artesanais - Simone dos Santos
Moldura para fotos 10x15 - R$ 27,00
(clique na foto para mais detalhes)






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